domingo, 2 de dezembro de 2012

E eu fiquei aqui.


O celular não atendia. Desisti de tentar. Já devia ser a trigésima chamada. Ou mais.
Eu  tenho esse problema. Não sei aceitar bem as coisas. Parece que até eu entender, eu ajo como se nada tivesse acontecido.
Há alguns dias as coisas não estavam bem.
Brigas, dor, lutas, dificuldades.
Hoje me peguei chorando.
Arrependida por tantas coisas que disse, e que ouvi também.
Quando tem um ponto final, sempre é um impacto forte.
Mas eu queria voltar atrás, ou poder seguir, qualquer coisa.
A inércia estava me matando.

Estava na porta do prédio dele.
Rodava o chaveiro nos meus dedos.
Estava sem coragem pra subir.

Ele havia me dado a chave, para o nosso conforto, dizendo que se um dia,
acontecesse alguma coisa, eu poderia estar segura ali.
Me perguntava agora se poderia achar segurança lá.

Mais uma lágrima escorreu.
Respirei fundo.
Entrei.
Passei direto pela portaria.
O porteiro estava cansado de me ver ali.
Chegava de madrugada, cedo, tarde...
Me deparei com o elevador e veio uma lembrança nossa.
As diversas vezes que eu reclamava de quando você tentava me agarrar
durante a rápida viagem do primeiro ao quarto andar. Eu ficava envergonhada só de pensar
na possibilidade de algum vizinho seu pegar o elevador e nos flagrar.
Um meio sorriso brotou, seguido de mais choro.
Tudo que eu queria era você ali, me agarrando nesse momento.

Saltei no quarto andar. Estava escuro. Acho que alguma luz queimou.
Não costumava ser assim ali.
Do corredor mesmo senti o cheiro do seu apartamento.
Um cheiro amadeirado.
Era uma mania sua. Sempre colocar o perfume, com pressa, pouco antes de sair.
Impregnava a sala.
E agora me invadia.
Me invadia de saudade.

Coloquei a chave na porta receosa. Queria apenas buscar algumas coisas.
Seria rápida.
Lembrei das várias vezes que você esqueceu a chave na porta, e eu não consegui entrar,
e ficava me provocando, me deixando trancada do lado de fora, enquanto eu dava chiliques.
É curioso como essas pequenas coisas marcam tanto.

Rodei a chave. O apartamento se revelou para mim.
Roupas jogadas na sala. Janela entreaberta. livros espalhados.
Eu não sabia mais o que eu fui fazer ali.
Por um segundo eu lembrei da nossa última briga e tive vontade de sair correndo de lá.
Mas não consegui.  Estava paralisada.

Passei pela sala e fui para o quarto.
Seu perfume estava vívido ali.

Cheguei no quarto e vi a cama desarrumada.
Não esperava mesmo vê-la arrumada.
Era eu, quando estava na sua casa, quem a arrumava pra você.
E agora? Como seria?

Sentei na cama que chamávamos de nossa.
Deitei a cabeça no travesseiro, com dor no coração.
Na cadeira estava o meu vestido floral que você amava me ver usando.
Ele devia estar ali desde a última vez que eu estive aqui.
Antes de tudo isso.
Entre lágrimas abri o seu armário e fui pegando todas as minhas coisas.
Roupas, cremes, perfumes...
Achei uma foto nossa.
Em um aniversário. Você fazendo careta.
Lembro quanto me irritava quando você fazia isso.
Mas a foto ficou realmente boa.
Levarei  ela comigo.
 Coloquei no meio das roupas que eu enfiava na mochila.
Olhei suas roupas.
A jaqueta que tanto gosto.
Queria ser breve, mas  estava difícil.
Tirei ela do cabide, e vesti.
Me senti abraçada na mesma hora.
Nada perto da maneira que você faz, claro.

Respirei fundo, e ainda vestindo sua jaqueta, fui pegando o resto das coisas.
Esse quarto era tão nosso...
Como seria daqui por diante?
Quem ficaria aqui? Quem arrumaria a cama?
Eu só conseguia chorar a cada pensamento que tinha nosso.

Eram onze horas. Eu precisava trabalhar. Mas eu não conseguiria.
Minha cabeça não conseguiria desviar de você.

Fui saindo do quarto.. Olhei uma última vez pro lugar onde dividimos tantas coisas.
Onde eu chorava no seu colo, onde dormíamos abraçados, onde tínhamos noites quentes
com horas de sexo intermináveis... O quarto é seu, mas eu olhava sentindo que um pedaço meu estava ali, e eu não poderia levá-lo

Chorando voltei até a cama e sentei nela. Chutei minha mochila pro chão.
Não queria ir embora. Ninguém escolhe essas coisas.
Juntei meus joelhos perto do rosto e abracei as pernas.
Olhava ao redor, com medo, sozinha, insegura.

Estava desprotegida.  Seu sorriso não consegue sair da minha mente.
Meu peito estava tão apertado que eu mal conseguia respirar.

O fim chegou pra nós tão violento, abrupto.. E eu nunca o quis.

Eu seria capaz de entender se fosse um término comum. Como tantos que tivemos.
Mas dessa vez, eu sei que não tem volta.
E é isso que nunca vai deixar de doer em mim
Se todas as vezes que te perdi em vida já me doeram...
Imagine para a morte...

E eu fiquei aqui...

terça-feira, 5 de junho de 2012

(?) - Interrogação

Ouvi a nossa música hoje.
Lembrei dos nossos beijos.
Lembrei dos nossos risos.
Do teu carinho quando eu chorava e mesmo eu não querendo você me enfiava no seu peito, eu negando, toda sem jeito, sem querer assumir que eu queria estar ali.

E eu to chorando agora.
Sem seu peito, sem seu jeito.
Sem o teu cheiro misturado as minhas lágrimas e seus sussurros de
"Passou, vai ficar tudo bem"

Eu passei a acreditar nisso.
A me agarrar à isso.
A precisar que aconteça isso.

Porque passou, não é?
Nós passamos. Somos passado.
Uma recordação, um cheiro, um afago.
Uma risada guardada naquela gaveta velha, emperrada.
Lá no fundo, enfurnardo, chafurdado no meu coração.

Eu to seguindo a vida.
Eu me pego descobrindo você ainda no meu dia.
Numa revista, numa roupa.
Numa piada, numa saudade.

Ah, é essa aí que me tira o prumo.
É como um vento frio que entra por baixo das cobertas...
Apesar de incomodar, não me gela. Me esquenta.
É quase um acalento, uma lembrança.
E eu dou aquele risinho.
E quando vejo o que fiz, brigo comigo.

Desisti de tirar você a força de dentro de mim.
Já te afoguei em copos das bebidas mais caras,
Já sai pelos mais longes e loucos lugares,
Já até me entreguei pra outros caras...
E tu continuavas ali. Dentro de mim.

Eu vejo um sorriso, e comparo com o teu.
Eu sinto um beijo, e penso no teu.
Eu não me vejo descansando em outro peito que não o teu.

Não é que o mundo seja sem graça.
Eu diria que no meu caminho surgiram saídas, luzes, novidades.
Acontece que você faz tudo que não é você perder a graça.

Eu me condeno porque eu me permito sentir luto por nós.
Nós. Era tão bom quando erámos nós.
Só. E agora estou a sós.
 
Peguei essa lágrima, a que eu minto toda vez que será a última
E vou colocar lá junto do nosso tesouro.
Chamo de tesouro, porque é isso que te considero.
Uma riqueza que eu encontrei, e que eu tenho só pra mim.
Um valor que só eu via, uma moeda que só eu usei.
E que só eu sei da sua valia.

Não tivemos nome, não tivemos definição
E talvez o que  hoje me faça chorar
É que nos falta uma conclusão.
Tudo que se refere a nós sempre acaba em interrogação.
Mas será que é nos permitido o fim?
Interrogação.




~E se pros outros já não faz sentido... Eu continuo tentando insistindo ~
E um dia, quem sabe, eu conte quanto tempo demorei pra publicar isso.

sexta-feira, 1 de junho de 2012

Que seja...

Eu já tirei essa saudade do peito
E agora eu vou atrás de um bom sujeito
Que me dê tudo o que você deixou faltar.

Que seus olhos sejam de verde verdade,
Suas mãos grandes de afago,
Suas palavras me encantem.
E que eu me apaixone.

Quero que ele cubra minhas angústias,
E levante minha saia.
Que não seja nada do que eu penso
Que me afogue no seu abraço
E me ponha um laço, enquanto tira minha renda.

Desse bom sujeito não espero muito
É pouco o que quero diante do que já quis
Hoje preciso de presença, de sentença, de calor.
Que ele seja meu amigo, meu homem, um confidente.
Que seja pro colo dele que eu corra ao chorar.
Que seja nos braços dele que eu acorde para vê-lo sorrir.

E que ele venha.
Que seja de verdade.
Que seja doce e por vezes ácido.
E que não tenha preguiça de fazer amor.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

O que cabe a mim.


E enfim eu cheguei à conclusão, difusa, depois de tanto tempo confusa, que em mim não cabe mais.

Não cabe mais desejo.
Não cabe mais em mim ciúme.
Raiva.
Felicidade.
Cumplicidade.
Esperança. E eu posso afirmar, não cabe mais em mim saudade.

Por ser tão extremista, eu sinto tudo muito literal, visceral. Sobra. Transborda.

E a persistência? Essa minha teimosia, vazia, que insiste no que não existe baseado em qualquer cisma de uma mentalidade totalmente sonhadora.
Ou doentia? 

E vivi cada dor, saboreei cada amargor, revivi cada momento feliz, e dupliquei os ruins.
Traguei momentos como cigarros, que me matariam lentamente, letalmente e eternamente. Querendo me enganar, me desvencilhar da idéia de vício, que alegava poder largar.

E nessa perdição, insana, eu buscava uma felicidade, um breve frescor, um pouco de ar no meio do sufocamento que sofria. E que nunca provei. Eu sufoquei.

Vou levar cicatrizes em coletivo, algumas feridas que vão ser sempre mexidas, talvez até por outras pessoas, inocentes que sequer saberão como lidar com elas. Talvez nem eu mesma saiba.

Mas tudo que sobrava em mim, transbordava de mim e que não te cabia, por ser imposto ao invés de recíproco, não cabe mais.

Não me cabe mais desculpas, não me cabe mais sorrisos, não me cabe mais afago, não me cabe mais teimosia, insistência, sadismo e tantos outros nomes que eu carregava em mim.

Porque hoje não me cabe mais você.

Não cabe mais você em mim.
Dentro de mim. Fora de mim.
Decreto aqui, o fim.
Um fim.

E por esvaziar meu eu, de tanta coisa que sobrava, hoje tenho espaços a serem novamente preenchidos. Com positividade, luz, e o que – ou quem - mais de bom quiser entrar.

Agora cabe. Cabem coisas boas em mim. Pois eu permiti, libertei, me deixei, eu quis e entendi que era pra ser assim.

Chegou ao fim. E isso tudo não cabe mais a mim.

terça-feira, 7 de junho de 2011

Vícios.

Ela abriu o isqueiro com um só movimento das mãos.
A chama veio alta e seu cigarro estava acesso.
Era o último.
A primeira tragada antes do fim do último.
Ela nunca conseguira lidar bem com términos e ciclos encerrados.
Era muito apegada visceralmente a tudo que lhe rodeava.
Passado, presente.
Tudo, para ela, era uma propriedade que não tinha o direito de entrar e sair da sua vida.
Nem quando ela mesma quisesse.

Durante anos, o cigarro fora não apenas um vício, mas algo marcante em sua personalidade.
Ela fumava uma marca importada. Cada vez mais difícil de achar no mercado.
Podia mudar de marca. Mas o cheiro do fumo adocicado era parte dela.
Ela odiava mudanças. Aquele fumo com seu odor a pertencia.
Logo, a dificuldade de encontrar aquele cigarro não era seu impecílio.
Era sua motivação.

Soltou a fumaça no ar apreciando o aroma doce.
Pensou em como tudo seria dali por diante.
Estava prestes a ter uma mudança na sua vida.
Estava prestes a ser a causadora de uma ruptura, uma separação na sua vida.
Tragou de novo. Sentiu certeza que aquilo era a coisa certa a ser feita.
Lembrou-se de como se apegou aos 16 anos ao vício.
Vislumbrou cenas de tanto tempo que vivera apegada aquilo.
E viu que era, finalmente, hora da mudança.

Observou pela janela os primeiros riscos violetas do dia que estava pra chegar.
A brasa na ponta do cigarro estava cada vez mais próxima de seus dedos.
O anúncio do fim.
Ter a certeza que ele estava próximo e saborear cada segundo do prazer, do momento.
Sentiu a última tragada.
Seus lábios estavam doces.
Sentia a tragada lhe escapar e viu-se aliviada.
Pronta pra larga-lo.
Livre.

Virando de lado, amassou a guimba rosada no cinzeiro.
Sacou a arma, já devidamente carregada com o silenciador e observou.
Apreciou o corpo inerte, adormecido profundamente de bruços ao seu lado.
Mirou na cabeça. Três disparos.
Seguidos. Silenciosos.
Sua vítima não teve nenhum tipo de reflexo.
Morto.

Era seu último. Seu último dia.

domingo, 22 de maio de 2011

Reencontros.


Eu estava lá. De novo.
Meus olhos inchados e vermelhos ardiam.
Lágrimas lavavam meu rosto.
Meus olhos só refletiam seu silêncio e sua imensidão ali, enquanto eu lhe confrontava.
- Porque ? - Perguntava aos prantos.
O vento passava pelas minhas costas e parecia me abraçar.
Silêncio.
- Eu estou fraca. Eu não aguento mais! É sempre assim... Tudo está muito bem, e do nada essa reviravolta... E tudo que eu recebo é silêncio e essa dor que eu estou sentindo? É isso?
Meus olhos buscavam respostas.
Elas não vinham e nem viriam.
Comecei a sentir repulsa. Repulsa de tudo ali.
Levantei-me depressa. Não ia ficar ali com aquele silêncio sepulcral.
Fui para frente do espelho e arrumei meu vestido. Observava o quão desmazelada eu estava depois daquilo tudo.
O ar faltava em meus pulmões. Começava a me acalmar quando olhei de novo.
Tudo que ainda estava preso e fazia mal dentro de mim, parecia magneticamente me colocar a sua frente de novo.
Choro. Mais choro.
E eu sentia dor de novo. Eu já a sentira antes, mas agora era excruciante.
E veio. Um calor, um desespero, uma angústia...
Cada pedaço do meu corpo tremia. Suava frio.
Te encarei de novo. Não conseguia sustentar mais o olhar.
Respirei, passei as costas das mãos nos olhos enxugando as lágrimas involuntárias.
- Espero sinceramente que essa tenha sido a última vez.
Decidida apertei a descarga. Pronto.
Estava finalmente aliviada.
Era a quarta vez que vomitava naquele mesmo dia.
Mal vejo a hora de chegar o sexto mês de gravidez e esses enjôos pararem de uma vez por todas.

sábado, 29 de janeiro de 2011

Abraços...

Senti sua mão de novo no meu rosto.

Afastei e me aconcheguei na cama, ajeitando o cabelo, e pude sentir você se mexendo de novo.

- Está tudo bem ? – Perguntei sem abrir os olhos.

- Não poderia estar melhor – Ouvi a voz embargada de sono.

Não era a voz que eu estava habituada a ouvir. Não era a voz que eu queria ouvir. Aquilo me deu um aperto no peito, forçando-me a abrir os olhos e te encarar.

- Bom dia – disse com a boca travada, sem ter real vontade de dizer nada. Na verdade sem nem querer estar ali.

- Bom dia meu amor. – Você veio e se aproximou para me beijar, e eu rapidamente cheguei o rosto pra trás deixando seus lábios mal tocarem os meus.

- Vou levantar e preparar as coisas pra sairmos. Me acompanha no banho?

- Sairmos? – perguntei confusa

- Sim, cabecinha de vento. Hoje é o almoço de aniversário da Camila. Esqueceu? – Você perguntou rindo da minha confusão.

- Claro que não, eu ... eu... – óbvio que eu havia esquecido, eu tinha me obrigado a esquecer esse maldito almoço – eu vou separar a minha roupa e ... pode tomar banho na frente, você demora menos mesmo...

Olhei pro armário na minha frente e suspirei. Abri as portas examinando algo que eu gostasse. Gostaria de achar uma burca que eu pudesse ir coberta dos pés a cabeça, já que não queria ser vista, nem notada, e de preferência, nem ir.

Vestido verde, muito curto. Vestido rosa, muito cafona. Vestido branco, muito transparente. Vestido floral, muito primavera. Calça e blusa social, muito calor.

Droga. Vai esse vermelho mesmo, que jeito. Ele tinha um corte bonito. Um decote moderado, saia rodada, e era confortável. A única coisa que estava errada era eu mesma, e isso eu não teria solução. Não podia deixar ele perceber que eu estava abatida, e sequer ele descobrir isso. Parei encarando meu espelho, respirei bem fundo, desfiz a boca cerrada de desgosto, e fui pegar os sapatos.

Escolhi sandálias altas da cor do vestido, e uma bolsa média.

Quando estava separando o perfume que iria usar, ele saiu do banho com a toalha amarrada na cintura. Olhei para o corpo definido, de cima a baixo, e pensei que talvez, se fosse um outro dia qualquer eu até sentiria mais desejo, mas hoje, eu não tinha condições.

- Lilian, tá tudo bem? Você sonhou com algo? Eu to sentindo você esquisita... – Me perguntou coçando a cabeça de lado com aquela cara de filhotinho de cachorro abandonado.

- Nada, Ale... Eu acho que estou ansiosa, é, ansiosa – olhei para o relógio e agarrei a tolha em uma das mãos – e se não me apressar podemos nos atrasar, não quero isso – e ri tentando disfarçar meu nervosismo.

Passei como uma flecha do lado de Ale... Ele me conhecia e acabaria por me trair se continuasse mantendo contato visual.

Abri a ducha e deixei a água gelada entrar em choque com o meu corpo. Estremeci, dando pulinhos no chuveiro, mas precisava disso pra acordar de verdade. Enquanto estava no banho, ensaiava mentalmente todas as falas que poderiam ser trocadas nesse almoço, e enquanto lavava os cabelos, rezava pras coisas serem menos ruins do que eu sabia que seriam.

Me vesti apressada, e Ale já estava pronto na sala. Incrível como em tão pouco tempo na minha casa ele já dominava o lugar. Eu gostava, afinal, a companhia dele era deliciosa. Eu na maioria das vezes não deixava ele ir pra casa, por estar tarde pra ele dirigir, e por querer alguém que me cuidava tanto, próximo a mim. Ele deixava uma blusa, duas, um sapato, e eu gostava disso... Mas estranhamente, hoje, eu o achei próximo demais.

- Você, linda como sempre. – Ale me elogiou.

Ele sempre me elogiava. Sempre.

- Obrigada. – disse meio envergonhada.

- Solte esses cabelos. Eles são lindos demais para você amarrar nesse cóqui tão sem graça – E ele veio e arrancou a presilha que prendia meus cabelos.

Eles caíram formando ondulações até o ombro. Negros e compridos.

- Agora sim, está perfeita – Sorrindo com aquele sorriso que me derretia – Vamos – Abrindo a porta para que eu passasse.

Respirei bem fundo, pus o cabelo pro lado, e saí decidida e firme.

Seguimos no carro dele até o restaurante onde seria o aniversário. Era um lugar fino, e deixamos o carro com o manobrista na porta.

Era lindo, em um deck, com uma visão privilegiada. O restaurante todo de vidro, deixava a marina e a natureza da cidade ao alcance de toda a visão.

Ale se dirigiu ao maitre, para identificar em qual mesa deveríamos sentar-nos. Rapidamente fomos guiados até uma mesa grande, com algumas pessoas conversando entre si, e alguns lugares vagos. Vi Camila sentada e fui cumprimentá-la e entregar seu presente comprado com semanas de antecedência. Camila era uma grande amiga, nos conhecíamos há anos, e tínhamos muitos amigos em comum. Quase fiquei feliz de estar ali desfrutando esse momento ao lado de alguém que tanto gostava.

Camila conhecia Ale de vista, somente. E de tanto que eu falava dele em nossas conversas. Ela levantou para receber o presente e eu apresentei ambos.

- Camila, Ale, Ale, Camila

- Muito prazer – Ale beijou-a no rosto – Feliz aniversário !

- O prazer é meu por finalmente conhecê-lo. Você é mais bonito pessoalmente do que nas fotos hein? Lilian tinha que ter te apresentado há mais tempo! – Camila fazia brincadeiras e eu tinha vontade de esganá-la.

- Nossa, você viu fotos minhas é? Hehe, obrigada pelo elogio, fico contente de lhe conhecer também. – Ale a essa altura estava bastante sem graça.

- Então, er, Camila é sempre espontânea assim, por isso nos damos tão bem né amiga? – Eu fuzilando Camila com os olhos. Ora, deixar meu acompanhante encabulado assim!

-Sentem-se por favor! – Camila indicou lugares do outro lado da mesa e de mãos dadas sentamos.

Olhei para alguns rostos conhecidos e cumprimentei acenando de leve com a cabeça, e Ale fazia o mesmo por educação. Eu estava nervosa, e não queria que ninguém percebesse. Escondi minhas mãos que estavam trêmulas por baixo da mesa, e deixei elas presas entre minhas pernas que sacudiam violentamente, batendo os pés no chão.

Mais pessoas chegavam, e pedimos um suco de frutas. Já havia passado do horário marcado, e ainda sobravam alguns lugares vagos. Conversava com as pessoas próximas a nós e Ale carismático, logo se enturmou, e discutia assuntos variados com o grupo.

Já tinha relaxado e estava com as mãos nos ombros de Ale rindo de uma lembrança que Camila havia acabado de contar, quando aconteceu.

Parecia que o ar do lugar havia sido sugado. Minha gargalhada morreu naquele instante.

Pude reconhecer os cabelos e o jeito de andar de longe, vindo em direção a nossa mesa.

Cada passo que ele dava, meu sorriso diminuía mais. O tempo havia parado, e por mim eu poderia morrer ali mesmo. Tudo estava em câmera lenta.

Eu sabia, ele sempre, sempre atrasava. Hábito que gerava brigas entre nós. Burra era eu de achar que ele, logo ele, teria mudado com o tempo.

- Boa tarde ! – Rodrigo chegou contagiante, sorriso largo, fazendo toda atenção se voltar para ele.

- Rodrigo!! Achei que você não viria mais!! – Camila levantando de um salto da cadeira e abraçando o convidado.

- Só me atrasei um pouco, mas jamais perderia o aniversário de uma pessoa tão especial – E abraçou Camila.

Eu olhava a cena paralisada. Era a primeira vez que eu o via em público, depois de... tudo.

Todas as brigas, as mágoas, o término de rompante, a minha viagem pra outra cidade, pra não procurá-lo nem que por engano, as intermináveis conversas por email, eu ouvir rumores que ele tinha finalmente se formado, na faculdade que eu tanto contribui para que ele concluísse, os amigos tentarem nos aproximar... Eu encontrar Ale...Tudo.

Engoli em seco, e olhei para o rosto dele. Não sei se propositalmente ou não, ele virou o rosto dele saindo do abraço de Camila em direção ao meu.

Os olhos cor de mel dele faiscaram cruzando com o verde dos meus. Senti um aperto imenso no peito e continuei olhando. Ele por sua vez correu os olhos por Ale que estava do meu lado olhando para o novo convidado, sem saber de nada. Eu não consegui pensar numa forma branda de dizer:

- Olha Ale, meu ex-namorado muito significativo pra mim que não vejo há meses,estará lá então não se preocupe caso eu fique meio pálida, gagueje, perca a fome, ou trema, é normal... Todo mundo passa por isso não é?

E ele foi sem nem saber quem era o Rodrigo. Ou o que foi o Rodrigo na minha vida.

Rodrigo olhou em volta, e foi cumprimentando uma por uma, as pessoas ao nosso redor até chegar no único lugar vago da mesa. Do meu lado.

Se eu naquele momento bebesse todo o gelo do balde, eu me sentiria melhor do que como estava ao saber o que viria a seguir.

- Lilian. Quanto tempo! – Rodrigo abriu os braços esperando que eu me levantasse.

Era impossível. Eu não sentia nada da cintura para baixo e tinha a certeza que o chão havia se aberto sob meus pés.

- Não vai falar comigo? – Rodrigo ainda sorrindo realmente achando que eu ia me levantar.

Apoiei as duas mãos na mesa e usei toda a pouca força que me restou pra me erguer. Enquanto levantava orava pra uma força maior abrir o chão de verdade e eu ser tragada para sempre por ele.

Isso não aconteceu. E eu olhando-o abri os braços timidamente e sem vontade.

- Estava precisando desse abraço – Rodrigo cochichou ao meu ouvido.

- Você não mudou nada? – Disse irritada enquanto sentia o perfume que eu havia dado a ele no nosso último aniversário de namoro.

- Talvez tenha engordado um pouco – Disse rindo enquanto nos separávamos do abraço.

Ale havia se levantado para cumprimentá-lo. Um disse rapidamente o nome para o outro.

Rodrigo olhava pedante para Ale, e Ale apertou as mãos dele sério.

Ao sentar de novo reparei que a mesa toda olhava aquela cena. Grande maioria presente conheceu a mim e a Rodrigo como um casal. E todos pareciam sentir a tensão gerada naquele reencontro.

Camila estava paralisada com a taça de Martini a caminho da boca e nem piscava.

Sentei encarando-a, e somente ali, ela voltou a si, e completou o gesto de levar à bebida a boca.

Trancei meu braço com o de Ale. Não queria nenhum tipo de intimidade com Rodrigo, e rezava pro tempo se acelerar e aquilo acabar logo.

- Você parecia nervosa, e agora eu vejo que está – Ale afagando meus cabelos e falando baixo ao meu ouvido.

- Eu fico assim em comemorações, não se preocupe... – Passei a mão no rosto de Ale

- Quem é esse pavão que chegou por último? – Ale perguntou indicando Rodrigo que já conversava alto com todos

- Um amigo do grupo. Das antigas sabe? – Disfarcei apressada.

- Carismático demais. Hunf. – Ale fechando a cara.

- Ah ele é assim mesmo... Não de atenção não... – Disse bebendo quase metade do meu suco de um gole só e deixando o copo na mesa com força.

Todos riam e confraternizavam. Ale havia desencanado da birra com Rodrigo e eu dava graças a Deus por isso.

- Vou ao banheiro – Ale levantando-se e me dando um beijo nos lábios.

- Ah também vou – Rodrigo se levantando.

Eu o conhecia. Ele não perderia a chance de fazer um comentário imbecil com Ale, e colocaria tudo a perder.

- Não!! – Quando vi eu já tinha falado, e já tinha falado alto demais.

- Não o que? – Ambos me perguntaram em uníssono.

- Am, er, bem, é... Fica chato dois convidados ainda mais homens irem ao banheiro juntos! Que coisa mais feminina né Camila? – Olhava pra minha amiga buscando um apoio desesperado

- Éééé.. ééé.. Eu não deixei! Senhor Rodrigo o Sr. Está há mais tempo no grupo, e eu lhe ordeno a não sair dessa mesa! E tenho dito que hoje é meu aniversário!

- Mas e se eu não me agüentar? – Rodrigo rindo com as mãos no bolso

- Aguenta sim, paguei muito caro nesse restaurante. Caro o suficiente até para limparem suas calças caso você não se agüente... Pode ir Ale, você eu não dou ordens não. Deixo essa liberdade para Lílian.

Ale saiu rindo da irreverência de Camila que já estava sob leve efeito dos Martinis e Rodrigo sentou-se na cadeira do meu lado de novo.

- Vejo que você está muito bem – Rodrigo se virando na cadeira acompanhando Ale com o olhar.

- Não sei o que você quer dizer com isso! – Disse encarando-o nervosa. Droga, os dentes dele continuavam lindos. E estavam tão perto de mim...

- Quis dizer que minha cor favorita é vermelho. E você está deslumbrante. A combinação com o cabelo ficou...Excelente. Tem o toque da sua personalidade. – Dizia e passava a mão nos meus cabelos na altura do ombro.

Tremi dos pés a cabeça quando senti a mão de Rodrigo no meu cabelo, e o contato tão leve com a minha pele. Tudo entre nós era muito sensual, e o toque dele eu não havia esquecido.

- Você segura sua onda!! Eu estou acompanhada e você não me faça um papelão aqui! Olha a ocasião que estamos! Respeite a Camila! Já que a mim né? – Repeli sua mão com a minha e olhei preocupada para trás achando que Ale podia ver essa cena.

- Esquentada e arredia como sempre. Certas coisas não mudam.

- Abusado, invasivo, e chamativo! Realmente certas coisas não mudam !!! – cruzei os braços e fiquei olhando para o meu copo mexendo o canudo do suco em giros rápidos.

Rodrigo me olhava com um sorriso.

Porque esse idiota estava achando graça? O que era divertido ? Será que era tão explícito que eu estava nervosa e ele se aproveitava disso pra zombar de mim?

Ale sentou do meu lado e voltamos a conversar. Eu adotei a tática de ignorar que Rodrigo estava ali, apesar de te-lo pego por duas vezes com os olhos no meu decote, e em ambas as vezes ,por sorte, Ale estava prestando atenção em outra coisa. Durante a conversa animada, por algumas vezes chutei a canela dele por baixo da mesa. Ele tinha prazer em ver um inferno.

E ele estava conseguindo manter as brasas bem acessas.

Olhei o relógio e cochichei para Ale que achava que poderíamos ir. Ele concordou e levantou-se para que chamassem o manobrista com nosso carro.

Ia me despedindo de todos rapidamente. Consegui evitar uma tragédia, mas estava em pedaços, me sentia como se tivesse lutado boxe com algum campeão mundial.

Camila me abraçou forte e cochichou comigo:

- Rodrigo ainda mexe com você não é?

- Eu não sei se eu estava preparada pra ser dessa forma. Mas, sim, mexe. – E olhei de rabo de olho para ele que me encarava sério.

Me despedi das outras pessoas e chegou a vez dele.

- Lilian, não precisa ter medo de mim, eu não quero seu mal. – Rodrigo levantando e me encarando

- Mas já o fez demais. Passe bem. – E inclinei meu rosto para dar um beijo no rosto dele, quando ele levantou.

- Quero outro abraço – E abriu os braços de novo. Aqueles braços, que tanto me fizeram feliz.

- Rodrigo. Eu... – Gaguejava, e no fundo eu tinha saudade dele. E do abraço dele. – Ok ok...

E o abracei. E o perfume dele de novo invadiu cada pedaço do meu corpo, e as mãos dele apertaram forte a minha cintura contra o corpo dele. E meu rosto encaixou no ombro dele, onde sempre o apoiava.

E foi bom.

Quando dei por mim disse:

- Tenho que ir - Empurrei-o meio de mal jeito e corri pra porta do restaurante a espera do carro de Ale sem nem olhar para trás.

O que eu estava fazendo meu Deus?

Entrei no carro e Ale pôs a mão sobre minha perna me fazendo carinho. Eu olhava pela janela sentindo um turbilhão dentro de mim.

- Te deixo em casa? – Ale perguntou sorrindo. Tão lindo, tão perfeito. Perfeito demais. Demais pra mim.

- Sim. Você vai pro escritório né? – Perguntei

- Sim. – E ele me beijou. E aquilo me incomodou.

Quando estávamos no sinal, meu celular recebeu uma mensagem. Revirei a bolsa para buscar, e encontrei.

‘- Se quiser outro abraço e conversar, estou em casa. Você sabe o caminho. Beijos’

E o número de Rodrigo.

Olhei em volta, para Ale, para o trânsito, vi que estava perto do prédio de Rodrigo.

- Ale, você poderia me deixar no próximo quarteirão? – Disse afobada.

- Ué, não vai pra casa amor? – Ale curioso.

- Er, não, eu vou no mercado, comprar... uma coisa. Que esqueci... – Menti gaguejando.

- Sim amor, você quem manda, como quiser... – Ale indicando a seta para estacionar meio desconfiado.

- Tenho que ir, estou com um pouco de pressa. Eu te ligo. – E saí batendo a porta do carro apressada.

Hoje eu teria outro abraço. Conversar, aí já é outra história...