terça-feira, 7 de junho de 2011

Vícios.

Ela abriu o isqueiro com um só movimento das mãos.
A chama veio alta e seu cigarro estava acesso.
Era o último.
A primeira tragada antes do fim do último.
Ela nunca conseguira lidar bem com términos e ciclos encerrados.
Era muito apegada visceralmente a tudo que lhe rodeava.
Passado, presente.
Tudo, para ela, era uma propriedade que não tinha o direito de entrar e sair da sua vida.
Nem quando ela mesma quisesse.

Durante anos, o cigarro fora não apenas um vício, mas algo marcante em sua personalidade.
Ela fumava uma marca importada. Cada vez mais difícil de achar no mercado.
Podia mudar de marca. Mas o cheiro do fumo adocicado era parte dela.
Ela odiava mudanças. Aquele fumo com seu odor a pertencia.
Logo, a dificuldade de encontrar aquele cigarro não era seu impecílio.
Era sua motivação.

Soltou a fumaça no ar apreciando o aroma doce.
Pensou em como tudo seria dali por diante.
Estava prestes a ter uma mudança na sua vida.
Estava prestes a ser a causadora de uma ruptura, uma separação na sua vida.
Tragou de novo. Sentiu certeza que aquilo era a coisa certa a ser feita.
Lembrou-se de como se apegou aos 16 anos ao vício.
Vislumbrou cenas de tanto tempo que vivera apegada aquilo.
E viu que era, finalmente, hora da mudança.

Observou pela janela os primeiros riscos violetas do dia que estava pra chegar.
A brasa na ponta do cigarro estava cada vez mais próxima de seus dedos.
O anúncio do fim.
Ter a certeza que ele estava próximo e saborear cada segundo do prazer, do momento.
Sentiu a última tragada.
Seus lábios estavam doces.
Sentia a tragada lhe escapar e viu-se aliviada.
Pronta pra larga-lo.
Livre.

Virando de lado, amassou a guimba rosada no cinzeiro.
Sacou a arma, já devidamente carregada com o silenciador e observou.
Apreciou o corpo inerte, adormecido profundamente de bruços ao seu lado.
Mirou na cabeça. Três disparos.
Seguidos. Silenciosos.
Sua vítima não teve nenhum tipo de reflexo.
Morto.

Era seu último. Seu último dia.